A linguagem dos Evangelhos: Como o aramaico influenciou o grego do Novo Testamento

Por Redação
25/12/2025 10h00 – Atualizado há 2 dias

Os Evangelhos do Novo Testamento foram escritos em grego koiné, a língua comum do mundo mediterrâneo no século I. No entanto, por trás desse grego acessível e direto, existe uma influência profunda de outra língua: o aramaico, idioma falado por Jesus e por grande parte da população da Palestina daquela época.

Essa convivência linguística deixou marcas claras no vocabulário, na estrutura das frases e até na forma de expressar ideias teológicas. Compreender essa influência ajuda não apenas na leitura bíblica, mas também no entendimento de como as línguas se moldam ao contexto cultural e histórico.

Qual era a língua falada por Jesus?

Historicamente, Jesus falava aramaico, uma língua semítica aparentada ao hebraico. O aramaico era o idioma do cotidiano, usado em conversas, ensinamentos orais e na vida comum do povo judeu.

Já o grego koiné era a língua da administração, do comércio e da escrita internacional. Por isso, os Evangelhos foram registrados em grego, mas carregando a forma de pensar e de falar aramaica de seus personagens e autores.

O que é o grego koiné do Novo Testamento?

O grego koiné era uma versão simplificada do grego clássico, amplamente difundida após as conquistas de Alexandre, o Grande. Ele permitia comunicação entre povos de diferentes regiões e níveis sociais.

No Novo Testamento, esse grego se caracteriza por frases curtas, vocabulário acessível e construções diretas, o que facilitou a transmissão da mensagem cristã. Ainda assim, muitas dessas construções refletem padrões típicos do aramaico.

Marcas do aramaico na estrutura das frases

Uma das influências mais perceptíveis do aramaico no grego dos Evangelhos está na estrutura sintática. O uso frequente de coordenação simples, com frases ligadas por “e”, é típico das línguas semíticas.

Além disso, repetições enfáticas e paralelismos são comuns, reproduzindo o estilo oral dos ensinamentos de Jesus, originalmente transmitidos em aramaico antes de serem registrados por escrito.

Palavras aramaicas preservadas no texto grego

Mesmo escritos em grego, os Evangelhos preservam termos aramaicos específicos, especialmente em momentos de forte carga emocional ou espiritual. Essas palavras foram mantidas para conservar o impacto original da fala.

Expressões como abba, talitha, ephphatha e eli são exemplos de como o aramaico atravessou o texto grego, funcionando quase como marcas de autenticidade histórica e linguística.

Influência semântica: pensar em aramaico, escrever em grego

Outro aspecto importante é a influência semântica. Muitas expressões gregas dos Evangelhos refletem conceitos típicos do pensamento semítico, não do grego clássico.

Isso explica por que algumas passagens parecem simples, mas carregam significados profundos, baseados em imagens concretas, metáforas agrícolas e relações familiares, características do aramaico falado no cotidiano.

A oralidade como ponte entre as línguas

Os ensinamentos de Jesus circularam inicialmente de forma oral, em aramaico. Somente depois foram organizados e escritos em grego. Esse processo fez com que o texto grego conservasse ritmos, repetições e fórmulas típicas da fala.

Essa oralidade explica a clareza, a força narrativa e o tom didático dos Evangelhos, que continuam acessíveis mesmo séculos depois de sua composição.

Por que essa influência é importante para a língua portuguesa?

Grande parte do vocabulário religioso do português veio de traduções do grego do Novo Testamento. Como esse grego já estava impregnado de aramaico, muitos conceitos bíblicos chegaram ao português carregando essa dupla herança linguística.

Assim, palavras, expressões e construções usadas até hoje em contextos religiosos refletem um encontro histórico entre línguas e culturas diferentes.

Uma herança linguística que atravessou séculos

A linguagem dos Evangelhos é um exemplo claro de como as línguas não existem isoladas. O aramaico moldou o pensamento, o grego registrou a mensagem e, mais tarde, outras línguas, como o latim e o português, deram continuidade a esse legado.

Essa mistura linguística ajudou a tornar o texto bíblico universal, compreensível e duradouro, preservando sentidos que atravessaram gerações.